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sábado, 13 de julho de 2013

O dilema do porco espinho


No ano de 1851 Arthur Schopenhauer em sua obra 'Parerga e Paralipomena' expõe a parábola do porco-espinho, mostrando de forma extremamente sagaz a sua ideia para a dinâmica das relações humanas. Ela consiste no seguinte:


Alguns porcos-espinhos no duro e gélido inverno decidiram se aproximar um do outro com o intuito de amenizar o incômodo causado pelo frio. Acontece que durante essa aproximação eles acabavam por se ferir com os espinhos alheios o que os obrigava a se afastarem  provocando-lhes novamente frio por estarem distantes um do outro.
Aos porcos-espinhos restam duas condições a saber, ou padecem com o frio ou são atormentados com os espinhos de seus semelhantes. Nisso consiste o dilema do porco-espinho.

Exposto o que vem a ser tal dilema passemos a analisá-lo com maior profundidade. O dilema é incompleto no sentido de que nos fornece apenas duas opções de escolha, onde na verdade podem existir tantas outras (isso costuma acontecer quando nos deparamos com dilemas que nos são propostos). Schopenhauer argumentava que no vai e vem dos porcos-espinhos (se afastando e se aproximando) existe um ponto intermediário que funcionaria como uma zona de conforto permitindo que eles permaneçam parcialmente aquecidos e parcialmente incomodados com os espinhos alheios.
O vazio e a monotonia são os agentes que levam o Homem a se aproximarem e viverem em sociedade. Quando do convívio percebem-se as qualidades desejáveis e os intoleráveis desejos. O convívio se dá mediante a determinação dos limites da zona de conforto os quais são delimitados através da educação e das boas maneiras. É dessa e somente dessa forma que pode dar-se a coexistência entre os Seres Humanos.

Há também aqueles casos onde o porco-espinho desenvolve uma espécie de calor próprio o qual faz com que seja desnecessário a convivência com os demais (considerando que eles se ajuntem para suportarem o frio) e o caso onde os porcos-espinhos desenvolvem resistência aos espinhos alheios fortalecendo as suas 'couraças'. A primeira dessas opções me parece utópica enquanto que a segunda é mais realista. Antes de discutir as razões para isso é interessante ressaltar que o Schopenhauer muitas vezes exaltou a condição da solidão como algo bom. Abaixo cito algumas de suas frases sobre esse tema:

“Como para mim as pessoas com quem vivo nada podem ser, meu maior prazer na vida são os pensamentos monumentais deixados por seres semelhantes a mim, que, como eu, uma vez vaguearam por entre a gente do mundo.”
(…) decidi dedicar o resto da minha vida efêmera totalmente a mim mesmo e, assim, perder o menor tempo possível com aquelas criaturas, a quem o fato de andarem sobre duas pernas, conferiu o direito de nos tomarem por seus iguais (…)”

"A solidão é a sorte de todos os espíritos excepcionais"

Agora passo a discorrer as razões pelas quais penso que o desenvolvimento do 'calor próprio' corresponde a algo utópico enquanto que o desenvolvimento de uma 'couraça resistente' é algo mais fácil de acontecer. A argumentação desenvolvida por mim surgiu a partir de um diálogo que tive com uma 'companheira intelectual' caso ela leia este post, ela saberá prontamente. Ela brilhantemente apontou outra objeção ao dilema do porco-espinho, não para a ideia contida no mesmo mas na escolha do animal para descrever essa parábola, pois a natureza sapientemente fez com que os seus espinhos não os machuquem durante as suas interações mas sim aos predadores que tentarem caçá-los.



O segredo para se viver nesse mundo consiste em perder a fé nas pessoas e na bondade delas. Elas são assim por natureza e dessa forma não há nada que possa ser feito, só nos resta aceitá-las como são. Eu não posso esquecer que também faço parte do gênero humano e portanto tenho os mesmos espinhos que qualquer outro, talvez até mais afiados, de modo que emitir um juízo sobre a humanidade como um todo consiste em emitir um juízo contra mim mesmo (é um tiro no pé). Acontece porém que por muitas vezes, durante a aproximação para com outros "porcos-espinhos", saímos extremamente feridos e qualquer tentativa de outra reaproximação torna-se algo um tanto traumático. As minhas experiências pessoais levaram-me por muito tempo a escolher o frio como uma boa alternativa, na verdade busquei durante muito tempo gerar "calor próprio", para suportá-lo, mas vi, que por minha condição humana não teria o efeito desejado. Ou seja, a minha natureza humana é que impede que eu possa gerar 'calor próprio' de modo eficaz. Para fazê-lo eu teria de 'matar' essa natureza, no entanto, antes que eu consiga (caso eu tente e me esforce muito) eu já estarei morto a muito tempo.
Uma das formas para que alguém fique louco é deixá-lo isolado do contato social. No filme náufrago, não é a toa que o personagem de Tom Hanks teve que criar um personagem imaginário. Temos que de algum modo interagirmos com algo ou alguém, mesmo que seja um ente imaginário, do contrário a loucura baterá na nossa porta.


O que quero dizer é que as pessoas não mudarão, mas isso não é razão suficiente para evitá-las, pois na verdade você já está imune as decepções por conhecer-lhes a natureza, desse modo, você de certa forma vai com uma espécie de couraça que lhe dá uma proteção extra aos espinhos alheios.
Como diria Tom Jobim: "...É impossível ser feliz sozinho". Ou ainda como disse John Donne: "Nenhum homem é uma ilha, completo em si próprio; cada ser humano é parte do continente, uma parte de um todo".

Para finalizar há algo que denomino 'magnetismo social' que algumas pessoas possuem, de modo que elas atraem para si as outras pessoas sem muito esforço. Tais pessoas são líderes natos. As causas para essa característica ainda não são muito claras para mim, pois ainda não me debati profundamente sobre o assunto. Eu contudo, devo ter 'espinhos tremendamente afiados', pois comigo o que acontece não é a atração das pessoas mas sim a repulsão. Talvez isso não seja de todo ruim, apenas gostaria de entender melhor as suas causas.



E quanto a vocês meus caros leitores, dentre as duas condições do dilema do porco-espinho, qual a que vocês escolheriam?

2 comentários:

  1. Os conceitos de introversão e extroversão apresentados por Carl Jurg são posteriores ao presente dilema, sendo talvez uma alternativa para explicar nossas preferências entre o isolamento e convívio social. Particularmente, considero tal explicação mais convincente, mas gostaria de argumentos contrários, ou seja, a favor de Schopenhauer.

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  2. Não só escolhi a segunda como já executo, hoje suporto a fraqueza dos fracos e não agrado a mim mesmo porém Jesus fez isso e eu tento todos os dias mesmo com falhas mais sempre saio ganhando.

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